A INCIDÊNCIA DA TEORIA DA IMPREVISÃO CONTRATUAL EM TEMPOS DE COVID-19
- Renato Godoy I. Oliveira
- 8 de abr. de 2020
- 4 min de leitura

É latente o debate sobre a CRISE ECONÔMICA gerada pelos impactos da “infecção generalizada” causada pela COVID-19 (CORONAVIRUS). CRISE esta que traz impactos diretos no Comércio e Saúde, aumentando os debates sobre o tema, uma vez que são estruturais pois impactam na capacidade arrecadatória nacional, bem como na necessidade cada vez maior de uma prestação de serviço público, cara e de qualidade.
Nas últimas semanas, ante aos polêmicos Decretos Estaduais, que impõe o fechamento do Comércio, em especial, dos serviços considerados não essenciais, surgiram vários questionamentos, no âmbito da economia familiar, a considerar que a maioria da população Brasileira, alocadas estatisticamente entre classe média e baixa, sentem e sentirão com maior “violência”, o impacto das restrições sobre o comércio que recaem inevitavelmente sobre o trabalho e emprego.
Desta feita, perguntas surgem sobre como pagar os débitos? O que fazer? Os Bancos vão suspender a aplicação de juros? Como agir, sem violar a boa-fé, base do negócio jurídico, digo, dos contratos firmados?
Quanto a temática, antes de adentrar necessariamente nas soluções, ou ainda, no fechamento ou imposições ideais aos questionamentos apontados, importante relembrar a aplicabilidade clara, da conhecida TEORIA DA IMPREVISÃO CONTRATUAL, nominada de rebus sic standibus, que pode ser abordada tanto no âmbito do Direito Civil, quanto do Direito do Consumidor.
No Direito Civil, tal teoria encontra previsibilidade no art. 478 do CC, com a seguinte redação:
"Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação."(g.n)
Verifica-se da leitura acima, que se extrai os seguintes elementos: a) Contrato Formal, b) Prestação Continuada e c) Onerosidade Excessiva, precisando para a configuração da teoria da imprevisão, da presença de todos conjuntamente.
Ainda, no CC, encontramos o art. 317 que traz a seguinte redação:
"Art. 317. Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação."(g.n)
O dispositivo supra, além de reforçar o disposto no art. 478, traz um alerta importantíssimo, que é a necessidade de ser discutida judicialmente a aplicação da Teoria da Imprevisão, não cabendo à parte, unilateralmente e sem qualquer Declaração Judicial, aplicar a teoria, pois o subjetivismo no presente caso não assegura segurança jurídica ou a aplicabilidade do instituto.
Nesse sentido, vejamos como tem se posicionado o Superior Tribunal de Justiça:
"EMENTA: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. TEORIA DA IMPREVISÃO E TEORIA DA ONEROSIDADE EXCESSIVA. HIPÓTESES DE CABIMENTO. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DO DESEQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO NO INSTRUMENTO CONTRATUAL. SÚMULA 7 DO STJ. 1. Esta Corte Superior sufragou o entendimento de que a intervenção do Poder Judiciário nos contratos, à luz da teoria da imprevisão ou da teoria da onerosidade excessiva, exige a demonstração de mudanças supervenientes nas circunstâncias iniciais vigentes à época da realização do negócio, oriundas de evento imprevisível (teoria da imprevisão) ou de evento imprevisível e extraordinário (teoria da onerosidade excessiva). 2. Na hipótese vertente, o Tribunal a quo ressaltou, explicitamente, que não pode ser reconhecida a imprevisão na hipótese vertente, em virtude de o recorrente ter pleno conhecimento do cenário da economia nacional, tendo, inclusive, subscrito diversos aditivos contratuais após os momentos de crise financeira, razão pela qual não seria possível propugnar pelo imprevisto desequilíbrio econômico-financeiro. 3. Nesse diapasão, o acolhimento da pretensão recursal, no sentido de reconhecer eventual onerosidade excessiva ou imprevisão, com o consequente desequilíbrio econômico-financeiro do contrato, demandaria a alteração das premissas fático-probatórias estabelecidas pelo acórdão recorrido, com o revolvimento das provas carreadas aos autos, o que é vedado em sede de recurso especial, nos termos do enunciado da Súmula 7 do STJ. 4. Agravo interno não provido.
(STJ - AgInt no REsp: 1316595 SP 2012/0062578-7, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 07/03/2017, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 20/03/2017)."
(g.n.)
Destarte, verifica-se que o STJ tem decidido reiteradamente no sentido de que, para que seja aplicada a Teoria da Imprevisão, deve-se demonstrar, categoricamente, quais foram os acontecimentos extraordinários que tornaram a prestação excessivamente onerosa, pois sem a sua comprovação, tal teoria não será reconhecida em juízo.
Reitere-se sem o prejuízo de cair em redundância, que não é qualquer evento que se enquadra na Teoria da Imprevisão, devendo ser evento fortuito e com potencialidade para alterar o equilíbrio do contrato.
Deve-se lembrar, que sem existir questionamento judicial, qualquer acordo ou concessão contratual realizada em benefício do devedor é resultado de MERA LIBERALIDADE, ainda que se considera a rebus sic standibus como cláusula intrínseca e não expressa dos contratos, como o dizem alguns juristas.
No Código de Defesa do Consumidor, ao consumidor se prevê a aplicação da Teoria da Imprevisão no art. 6º, inciso V do CDC que traz in verbis:
"Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
Omissis... V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;"(g.n)
Inevitavelmente, se verifica a aplicabilidade da Teoria da Imprevisão também aos Contratos de Relação de Consumo, porém, ressalte-se sem o prejuízo de cair em redundância, que DEVE TAL CONDIÇÃO SER DECLARADA JUDICIALMENTE.
Dito isto, ao contrário do que muitos alegam, a auto declaração de aplicabilidade da teoria da imprevisão não resolve o problema, sendo a solução em primeiro momento, uma ponte que deve ser construída com base no princípio da razoabilidade e proporcionalidade, após consulta amigável credor a credor.
Da mesma forma, irresponsável é declarar a todo acontecimento a certeza da aplicação da referida teoria, sendo certo de que a decisão acertada é aguardar, neste momento, as primeiras decisões do Judiciário para que se possa ter um norte da tendência jurisprudencial a ser seguida.
Sendo assim, sugere-se em um primeiro momento, a tentativa de negociação administrativa, onde, não sendo possível, a procura de um Advogado Habilitado, Profissional da sua confiança, para tomar as medidas cabíveis, em sendo possível, para a solução judicial quanto ao débito em comento, havendo a necessidade de se analisar caso a caso.
Comments